sexta-feira, 5 de julho de 2013

Morto e ressuscitado.

Em um dia marcado por recuos e mensagens contraditórias, o governo chegou a reconhecer a impossibilidade da realização de um plebiscito sobre reforma política este ano, a tempo de valer em 2014, mas depois voltou atrás, com uma nota oficial do vice-presidente Michel Temer, reafirmando o compromisso com a consulta em data que altere o sistema político-eleitoral já nas eleições do ano que vem.

Uma reunião pela manhã no Palácio do Jaburu, entre Temer, ministros e líderes aliados, pareceu ter jogado a pá de cal na proposta do plebiscito, 48 horas depois da chegada ao Congresso da sugestão da presidente Dilma Rousseff para a consulta popular. Ao fim do encontro, o próprio vice-presidente reconheceu a inviabilidade da medida.

- Embora fosse desejável, temporalmente é impossível. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE), muito adequadamente, fixou um prazo de 70 dias a partir de quando os temas forem apresentados ao TSE. Imagina se isso durar três semanas, com mais 70 dias já chegamos ao mês de outubro. E, a partir daí, já entra o princípio da anualidade. Não é possível aplicar em 2014 - disse Temer, na porta do Jaburu.

Perguntado se o adiamento da reforma política seria aceito, o vice-presidente afirmou:

- O que é inexorável tem que ser aceito.

Pouco depois, em Salvador, a presidente Dilma fazia uma defesa enfática do plebiscito, forçando um recuo de Temer.

Da reunião do Jaburu participaram, além de líderes da base aliada, os ministros Ideli Salvatti (Relações Institucionais), Aloizio Mercadante (Educação) e José Eduardo Cardozo (Justiça). O ministro Cardozo também reproduziu na porta da residência oficial do vice-presidente a conclusão da reunião:

- Há a avaliação de que tecnicamente seria muito difícil fazer agora o plebiscito.

No fim da tarde, porém, Michel Temer, em nota, e o ministro Cardozo, em entrevista coletiva, reafirmaram que a posição do governo é de defesa da reforma ainda este ano. 

O governo já sabe que não há tempo nem vontade política dos partidos da base de votar a proposta no Congresso, mas a reforma política foi a primeira tábua de salvação encontrada pela presidente desde que seus índices de popularidade desabaram, e a orientação política é que não será o governo, nem o PT, que desistirá da ideia. 

As pesquisas indicando que cerca de 70% da população apoia um plebiscito ou uma constituinte exclusiva para a reforma política reforçaram a decisão.

O recuo de Michel Temer, apresentado como um esclarecimento de sua posição e não um recuo, ocorreu duas ou três horas depois do discurso da presidente em Salvador. 

Ele nega que tenha sido cobrado pela presidente. A nota oficial tinha o objetivo de ressaltar que a posição do governo não se alterou, ainda que, reservadamente, o vice-presidente não tenha dúvidas quanto à inviabilidade dela. 

"Embora reconheça as dificuldades impostas pelo calendário, reafirmo que o governo mantém a posição de que o ideal é a realização do plebiscito em data que altere o sistema político-eleitoral já nas eleições de 2014", disse o vice em seu texto, acrescentando que sua declaração anterior se referia à opinião de alguns líderes.

Em entrevista, no início da noite, o ministro da Justiça afirmou:

- O governo reitera que o ideal é que a reforma política seja realizada para as eleições de 2014. Entretanto, obviamente, será o Congresso que, avaliando as respostas do TSE, vai definir isso.

Como vem ocorrendo desde a semana passada, o vai e vem sobre o assunto acabou desaguando em mais uma crise na base no Congresso. De um lado, o PT, que mais cedo também reconhecia a dificuldade temporal para a realização da consulta, voltou a fincar pé em defesa do plebiscito. 

Do outro, PMDB e aliados questionavam o recuo após a reunião da manhã ter sacramentado o fim da consulta.

O líder do PMDB na Câmara, Eduardo Cunha (RJ), ficou surpreso ao ser informado sobre o recuo de Temer. Disse que na reunião da manhã ficou combinado que esperariam um encontro com líderes do Senado, mas que o entendimento era de que o plebiscito não valeria para as eleições de 2014 pela inviabilidade de prazos. 

Segundo Cunha, o PMDB não arcará com gastos desnecessários de um plebiscito e a frustração do eleitor de ver mudanças eleitorais aprovadas este ano, e que não irão valer para a eleição do ano que vem.

- Foi o recuo do recuo do recuo. Não foi isso que se combinou na reunião de líderes. Não sei se foi desautorizado pelo discurso da Dilma na Bahia. Que o plebiscito não valerá para o ano que vem, todo mundo sabe. Nós, na bancada do PMDB da Câmara, só votaremos plebiscito que seja realizado no segundo turno da eleição de 2014. E ponto! Constituinte somos contra porque cria uma insegurança jurídica no País. Não houve uma ruptura democrática para justificar uma Constituinte - disse Cunha.

Também correligionário de Temer, o senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES) alfinetou:

- Que foi um constrangimento para o Temer foi. Agora, uma coisa é uma pessoa submeter, outra é a pessoa aceitar essa submissão. O Temer, para ser respeitado, precisa se respeitar. 

Se ele se submete a essa relação vertical, não pode reclamar. Essa relação baseada no poder de mando, nem no cangaço com Maria Bonita. Está um barata voa, improvisação em cima de improvisação.

De volta ao Congresso no fim da tarde, o líder do PT na Câmara, José Guimarães (CE), tentou novamente se equilibrar na explicação:

- O governo insiste que o melhor prazo para a realização do plebiscito é 2013 e para valer em 2014. Mas há muitas dificuldades.

A opinião do PT é que o fundamental é colocar o partido e a presidente como os grandes defensores da reforma política, deixando para o Congresso e a oposição a responsabilidade caso ela não ocorra.


O Globo 

Nenhum comentário: